ACOLHIMENTOS EMERGENCIAIS DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES E A INVIOLABILIDADE DE DOMICÍLIO: UMA ANÁLISE À LUZ DOS PRECEDENTES DO STJ

30/05/2021

Em 02 de março de 2021, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça proferiu decisão histórica concedendo ordem de habeas corpus para anular prova obtida durante invasão policial não autorizada em uma residência e absolver o paciente condenado pela prática de tráfico de drogas (STJ, HC 598.051)[1]. No caso, embora os policiais miliares tenham alegado que tiveram autorização do morador para ingressar na casa, o acusado afirmou que os agentes forçaram a entrada, a qual não conseguiu resistir.

O precedente segue orientação do próprio Supremo Tribunal Federal que, no julgamento do RE 603.616, com repercussão geral reconhecida, aprovou a tese de que a entrada forçada em domicílio, sem mandado judicial, só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em razões concretas, devidamente justificadas posteriormente, que indiquem que dentro da casa ocorria situação de flagrante delito.

Pois bem. Como se sabe, o Estado, historicamente, intervém na vida das pessoas, restringindo seus direitos fundamentais nas mais diferentes searas, pelos mais diversos motivos, sempre com o objetivo declarado de proteger terceiros, bens constitucionais coletivos ou, ainda, de promover objetivos impostos pelo Poder. Basta que lembremos da admissibilidade de interceptações telefônicas como restrição à privacidade e ao sigilo das comunicações, para fins de investigação criminal ou instrução processual penal. Todavia, para que tais propósitos não redundem em violações, cabe ao Direito regulamentar e, em especial, controlar (a partir da imposição de limites) tais formas de intervenção.

Fala-se, então, na existência de um direito penal (ou processual penal) garantista, como redutor das violações e violências praticadas pelos agentes do Estado a pretexto da repressão de crimes. Fala-se, também, nas garantias do administrado contra as intervenções realizadas pelos agentes do Poder Público (por exemplo, no exercício do poder de polícia) e em garantias do contribuinte contra o Fisco, dentre outras.

De modo semelhante, quando o Estado intervém na vida de famílias – e, principalmente, na vida de famílias historicamente marginalizadas –, ainda que a pretexto de proteger crianças e adolescentes, destinatários de proteção integral e prioridade absoluta (art. 227, CF), também precisamos contar com um aparato legal e jurídico que proteja as pessoas (pais, mães, tios, avós, madrinhas, padrinhos) contra abusos e novas violências.

Luigi Ferrajoli aponta que o “garantismo” pode ser compreendido de três formas diversas, mas conexas: como um modelo normativo de direito; uma teoria jurídica da “validade” e da “efetividade”; e uma filosofia política que requer do Estado o ônus da justificação.

Segundo o autor, o garantismo tem sua espinha dorsal no princípio da estrita legalidade (ou da legalidade substancial), a minimizar a violência estatal e maximizar a liberdade no exercício dos direitos dos cidadãos. A Constituição, nesse ponto, se apresenta como um parâmetro de racionalidade, de justiça e legitimidade da atuação estatal, tanto em uma perspectiva formal quanto substancial. Formalmente submete as leis ordinárias já existentes e as que serão criadas a parâmetros de iniciativa e de hierarquia formal; substancialmente, quanto ao seu significado, impõe o dever de efetivar e de não contrariar o conteúdo de normas constitucionais, possibilitando-se a existência de uma norma formalmente válida, mas substancialmente inválida se seu significado estiver em contrariedade com normas constitucionais substanciais (daí o diferencial entre o “princípio da legalidade formal” ou “mera legalidade” e o “princípio de legalidade substancial” ou da “estrita legalidade”). Por fim, exige-se do Estado a separação entre direito e moral, entre validade e justiça, entre o “ser” (criação da norma) e o “dever ser” (condições de sua validade) do direito. “Essa foi a conquista mais importante do direito contemporâneo: a regulação não só das formas de produção jurídica, mas também dos conteúdos normativos produzidos”[2], com a subordinação do Poder Legislativo à lei.

A prática revela, todavia, que o “Garantismo Estatutário”[3], mormente no campo da chamada “infância protetiva”[4] , ainda é absolutamente incipiente, senão completamente inexistente. Como exemplo desta afirmação, basta verificarmos que, de acordo com os principais levantamentos nacionais sobre o acolhimento institucional de crianças e adolescentes, grande parte destes é institucionalizada por decisão (muitas vezes unilateral) dos Conselhos Tutelares.

O primeiro levantamento nacional realizado pelo IPEA (2004), por exemplo, constatou que 88% dos casos de acolhimentos institucionais de crianças e adolescentes foram encaminhados por Conselheiros ou Conselheiras Tutelares[5]. Já o levantamento realizado pela Fiocruz (2014) constatou que 52,9% dos acolhimentos institucionais foram realizados pelos Conselhos[6].

Sucede que, ao menos desde 2009, com o advento da Lei nº 12.010, Conselheiros e Conselheiras Tutelares não possuem (mais) atribuição para aplicar a medida de acolhimento institucional, já que sua aplicação está submetida à inequívoca reserva de jurisdição (art. 101, §2º, ECA). Nada obstante, raramente se lê alguma notícia ou se ouve falar que a maioria dos casos de acolhimento institucional de crianças e adolescente é ilegal, abusiva e violadora de direitos.

Sem grandes incursões nesse tema, que merece um estudo a parte, a lei 12.010/09 introduziu o parágrafo único ao art. 136 do ECA, impondo que, se no exercício de suas atribuições o Conselho Tutelar entender necessário o afastamento do convívio familiar, comunicará incontinenti o fato ao Ministério Público, prestando-lhe informações sobre os motivos de tal entendimento e as providências tomadas para a orientação, o apoio e a promoção social da família, tornando letra morta a menção ao inciso VII constante do art. 136, I, do ECA[7].

Além disso, para que haja a possibilidade de acolhimento institucional, primeiro se faz necessário o afastamento da criança do convívio familiar com sua família de origem, providência  que passou a competir exclusivamente à autoridade judiciária, em procedimento necessariamente contencioso, deflagrado pelo Ministério Público ou quem tenha legítimo interesse, garantindo-se aos pais ou ao responsável legal o contraditório e a ampla defesa (art. 101, §2º e art. 153, caput e seu p. ún., do ECA); só depois será possível a aplicação da medida de acolhimento, a qual, também, passou a ser de competência exclusiva da autoridade judiciária, com a Lei 12.010/09, considerando o teor do art. 101, §3º, do ECA que exige que “crianças e adolescentes somente poderão ser encaminhados às instituições que executam programas de acolhimento institucional, governamentais ou não, por meio de uma Guia de Acolhimento, expedida pela autoridade judiciária”.

O silêncio a respeito da ilegalidade dos inúmeros acolhimentos institucionais realizados em contrariedade aos ditames do Estatuto, todavia não tem (e nem pode ter) o condão de convalidar violações e legitimar violências.

Exsurge, assim, a possibilidade de se buscar mecanismos de defesa e resistência contra tais acolhimentos indevidos a partir do diálogo entre o campo teórico-interdisciplinar do direito da criança e do adolescente e a dogmática constitucional (em especial a teoria geral dos direitos fundamentais).

Inicialmente, deve-se consignar que a garantia da inviolabilidade do domicílio enquanto último refúgio do indivíduo, no qual ele pode expressar toda a sua intimidade com parentes e demais pessoas de sua confiança, bem como onde são transmitidas culturas, crenças e toda a educação dos filhos, é considerada partícipe matriz da dignidade da pessoa humana[8].

Por essa razão é que se pode sustentar, como o faz o Professor Leonardo Martins, que “o domicílio goza, quando ‘enriquecido’ com a dignidade da pessoa humana e o mandamento constitucional da observância incondicional de uma esfera do desenvolvimento exclusivamente privado e personalíssimo, de uma proteção absoluta (...). Nem mesmo interesses muito importantes da coletividade têm o condão de justificar uma intervenção nessa liberdade para o desenvolvimento em questões personalíssimas que tenham ligação com a dignidade da pessoa humana”.

Aludido “enriquecimento” com a dignidade da pessoa humana decorre justamente da grande intersecção entre a inviolabilidade do domicílio e doutros direitos fundamentais, como o direito ao livre desenvolvimento da personalidade, a liberdade de consciência e crença, a proteção do casamento e da família, o direito à educação dos filhos, a liberdade de reunião, a liberdade profissional, o direito de propriedade, entre outros. Daí porque o art. 1.513 do Código Civil assevera que “é defeso a qualquer pessoa, de direito público ou privado, interferir na comunhão de vida instituída pela família”

É lógico que de tal assertiva não se pode concluir que a inviolabilidade do domicílio seja um direito absoluto – até porque, em regra, nenhum direito fundamental o é[9]. Também essa liberdade, portanto, deve ser analisada sob a ótica da dogmática constitucional, notadamente quanto aos mecanismos de controle e aos limites às intervenções estatais no respectivo âmbito de proteção (limites dos limites).

O art. 5º, inciso XI, da Constituição Federal prevê que “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”.

Para os fins da análise ora proposta, faz-se também oportuna a transcrição do art. 101, §§1º e 2º, do Estatuto da Criança e do Adolescente, que apresentam os contornos gerais sobre a medida de acolhimento institucional. O §1º dispõe que “o acolhimento institucional e o acolhimento familiar são medidas provisórias e excepcionais, utilizáveis como forma de transição para reintegração familiar ou, não sendo esta possível, para colocação em família substituta, não implicando privação de liberdade”.

Já o §2º prevê que, “sem prejuízo da tomada de medidas emergenciais para a proteção de vítimas de violência ou abuso sexual e das providências que alude o art. 130 desta Lei, o afastamento da criança ou adolescente do convívio familiar é de competência exclusiva da autoridade judiciária e importará na deflagração, a pedido do Ministério Público ou de quem tenha legítimo interesse, de procedimento judicial contencioso, no qual se garanta aos pais ou ao responsável legal o exercício do contraditório e da ampla defesa”.

A leitura conjugada de todos os dispositivos pode conduzir às seguintes conclusões-parciais:

1. Em sendo medida excepcional e justamente por restringir direitos fundamentais, sobretudo o direito à convivência familiar entre pais e filhos, a aplicação da medida de acolhimento institucional deve se submeter à reserva de jurisdição[10] e, portanto, não prescinde de ordem judicial fundamentada em razões suficientes que constatem a licitude do propósito perseguido e do meio utilizado, a adequação e necessidade da medida (teste da proporcionalidade)[11]

2. Em situações emergenciais, como o desastre, a necessidade de prestação de socorro ou a prática de violência grave e atual contra crianças e adolescentes, admite-se que as entidades que mantenham programa de acolhimento institucional procedam, em caráter excepcional e de urgência, ao acolhimento de crianças e adolescentes sem prévia determinação da autoridade competente, fazendo comunicação do fato em até 24 (vinte e quatro) horas ao Juiz da Infância e da Juventude, sob pena de responsabilidade (art. 93, ECA)[12]

3. Nas situações retratadas acima (b), é possível o ingresso no domicílio da criança, por qualquer um do povo, mesmo sem autorização dos pais, para que a proteção extrema (acolhimento institucional) possa ser realizada, desde que respeitadas determinadas condições. No limite, estamos em uma situação respaldada pelo estado de necessidade.

Neste ponto, chega-se à tese central do presente artigo. Parece-nos que, por identidade de características, são perfeitamente extensíveis e aplicáveis as condicionantes consolidadas pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do HC 598.051 também aos chamados “acolhimentos emergenciais”, ou seja, aos acolhimentos institucionais realizados independentemente de prévia ordem judicial.

Em primeiro lugar, consolidou a 6ª Turma que, na hipótese de suspeita de crime em flagrante, exige-se, em termos de standard probatório para ingresso no domicílio do suspeito sem mandado judicial, a existência de fundadas razões (justa causa), aferidas de modo objetivo e devidamente justificadas, de maneira a indicar que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito.

Ora, outra não poderia ser a conclusão, já que, quando falamos de uma inviolabilidade do domicílio, sustentamos uma “proibição apriorística” endereçada aos órgãos estatais de adentrarem o domicílio sem prévia anuência do titular do direito[13].

Em relação aos “acolhimentos emergenciais”, parece-nos que a exigência acima atende não só a garantia da inviolabilidade do domicílio dos pais, mas também a própria natureza excepcional da medida extrema, que deve ser preterida toda vez que se constatar a possibilidade de aplicação de medidas de proteção alternativas (como aquelas previstas no art. 19-B, 101, incisos I a VI, 129 e 130, do ECA ou mesmo as medidas previstas no art. 21 da Lei nº 13.431/17), em atenção ao princípio da intervenção mínima (art. 100, p. ún., VII, do ECA).

Ainda, em relação aos standards probatórios para ingresso no domicílio, importante que se recorde do chamado “estudo diagnóstico”, previsto nas Orientações Técnicas para Serviços de Acolhimento de Crianças e Adolescentes[14] e construído dialogicamente com diversos atores e atrizes do Sistema de Garantia de Direitos (SGD)[15], cuja finalidade é justamente atestar a urgência da situação e o exaurimento ou ineficácia das demais medidas de proteção para afastamento da situação de violação de direitos, atual e concreta, a que está submetida a criança ou o adolescente.

Por outro lado, muitas situações de violência e maus tratos contra crianças e adolescentes, embora aconteçam de forma reiterada no âmbito familiar, nem sempre poderão autorizar a entrada no domicílio sem mandado judicial. Apenas deverá ser permitido o ingresso em situações de urgência – excepcionando-se, portanto, a cláusula da reserva de jurisdição e restringindo-se os direitos fundamentais dos pais, dentre os quais a inviolabilidade do domicílio – quando se concluir que violência é grave, concreta e atual, bem como que o atraso decorrente da obtenção de mandado judicial pode, objetiva e concretamente, expor a criança ou adolescente a risco de lesão (em sentido amplo) grave ou morte.

No julgamento do HC nº 598.051, o próprio Relator, Ministro Rogério Schietti Cruz,  lembrou que, “se o próprio juiz só pode determinar uma busca e apreensão em decisão fundamentada, não seria razoável permitir que um servidor da segurança pública tivesse total discricionariedade para, a partir de uma avaliação subjetiva, entrar de maneira forçada na residência de alguém”.

Em quaisquer outras circunstâncias, como para realizar o atendimento e a escuta dos membros da família ou mesmo para se averiguar a procedência, ou não, de eventual denúncia anônima (em geral, via “Disque 100”[16]), o consentimento do morador, para validar o ingresso de agentes estatais (como Conselheiros/as Tutelares) em sua casa e a busca e apreensão de elementos de prova, precisa ser voluntário e livre de qualquer tipo de constrangimento ou coação.

Outrossim, a prova da legalidade e da voluntariedade do consentimento para o ingresso na residência do suspeito incumbe, em caso de dúvida, ao Estado, e deve ser feita com declaração assinada pela pessoa que autorizou o ingresso domiciliar, indicando-se, sempre que possível, testemunhas do ato. Recomenda-se, ainda, que, assim como exigido por parte de policiais militares e civis, a operação deve ser registrada em áudio-vídeo, e preservada tal prova enquanto durar o processo.

Por fim, a violação a essas regras e condições legais e constitucionais para o ingresso no domicílio alheio resulta na ilicitude das provas obtidas em decorrência da medida, bem como das demais provas que dela decorrerem em relação de causalidade, sem prejuízo de eventual responsabilização penal dos agentes públicos que tenham realizado a diligência.

Diante de todo o exposto, parece-nos evidente que, embora crianças e adolescentes sejam titulares de um direito amplo à proteção integral, inclusive com prioridade absoluta, o argumento de sua proteção jurídico-constitucional não tem o condão de afastar outros interesses igualmente constitucionais dessas mesmas crianças e adolescentes e de seus pais[17], como do direito à intimidade, privacidade, proporcionalidade, atualidade, convivência e planejamento familiar, não sendo raras as hipóteses em que, com o argumento de se proteger a criança de um pai agressor, por exemplo, acolhe-se institucionalmente a criança e, com isso, nada se faz em relação ao agressor que eventualmente poderá continuar a perpetrar agressões contra a mãe dessa criança – que é tão vítima quanto ela – e ainda se cria um sentimento de culpa na criança acolhida, separada de seus pais e colocada em um local estranho e com pessoas estranhas, pela sua própria condição[18].

 

Notas e Referências

[1] Em suma, a 6ª Turma estabeleceu cinco teses centrais, que devem orientar futuros julgamentos. São elas:

1) Na hipótese de suspeita de crime em flagrante, exige-se, em termos de standard probatório para ingresso no domicílio do suspeito sem mandado judicial, a existência de fundadas razões (justa causa), aferidas de modo objetivo e devidamente justificadas, de maneira a indicar que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito.

2) O tráfico ilícito de entorpecentes, em que pese ser classificado como crime de natureza permanente, nem sempre autoriza a entrada sem mandado no domicílio onde supostamente se encontra a droga. Apenas será permitido o ingresso em situações de urgência, quando se concluir que do atraso decorrente da obtenção de mandado judicial se possa, objetiva e concretamente, inferir que a prova do crime (ou a própria droga) será destruída ou ocultada.

3) O consentimento do morador, para validar o ingresso de agentes estatais em sua casa e a busca e apreensão de objetos relacionados ao crime, precisa ser voluntário e livre de qualquer tipo de constrangimento ou coação.

4) A prova da legalidade e da voluntariedade do consentimento para o ingresso na residência do suspeito incumbe, em caso de dúvida, ao Estado, e deve ser feita com declaração assinada pela pessoa que autorizou o ingresso domiciliar, indicando-se, sempre que possível, testemunhas do ato. Em todo caso, a operação deve ser registrada em áudio-vídeo, e preservada tal prova enquanto durar o processo.

5) A violação a essas regras e condições legais e constitucionais para o ingresso no domicílio alheio resulta na ilicitude das provas obtidas em decorrência da medida, bem como das demais provas que dela decorrerem em relação de causalidade, sem prejuízo de eventual responsabilização penal dos agentes públicos que tenham realizado a diligência.

[2] FERRAJOLI, Luigi. “Estado de Direito: história, teoria, crítica”. In: Estado de Direito entre o passado e o futuro. COSTA, Pietro, ZOLO, Danilo (orgs.). Tradução de Carlo Alberto Dastoli. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 429.

[3] Nesse artigo, o termo “garantismo estatutário” se refere ao reconhecimento de direitos subjetivos e garantias (materiais e processuais) em prol dos indivíduos, contra intervenções do Estado que, a pretexto de proteger crianças e adolescentes,  violem seus próprios direitos fundamentais (por exemplo, olvidando de sua condição de sujeitos de direitos) ou de seus familiares.

[4] A chamada “infância protetiva” abarca, de modo residual, todo o campo dos direitos da criança e do adolescente que não se referem à prática de atos infracionais ou à imposição e execução de medidas socioeducativas. Cuida, em suma, da proteção, defesa e promoção de direitos fundamentais de crianças e adolescentes (como o direito à vida, à liberdade, à saúde, à educação e à convivência familiar e comunitária).

[5] Disponível em: https://crianca.mppr.mp.br/arquivos/File/publi/ipea/direito_a_conviv_familiar_ipea_2004.pdf, p. 66

[6] Disponível em: https://static1.squarespace.com/static/56b10ce8746fb97c2d267b79/t/56b4f6f38a65e204ee2647ab/1454700286830/levantamento_nacional_das_criancas+e+adolescentes_em_servicos_de_acolhimento.pdf, p. 47

[7] Nesse sentido: ROSSATO, Luciano; LÉPORE, Paulo; CUNHA, Rogério. Estatuto da Criança e do Adolescente comentado artigo por artigo. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2019, p. 353.

[8] MARTINS, Leonardo. “Liberdade e Estado Constitucional: leitura jurídico-dogmática de uma complexa relação a partir da teoria liberal dos direitos fundamentais”. São Paulo: Atlas, 2012, p. 317

[9] A doutrina ressalva algumas poucas hipóteses, como a vedação da tortura e da escravização.

[10] A inviolabilidade do domicílio deve também ser assegurada processualmente, principalmente por meio da fiscalização pelo órgão jurisdicional. Incorporando mais uma vez os ensinamentos de Leonardo Martins, “a reserva de jurisdição significa, antes de ser uma autorização de intervenção outorgada ao juiz (...), a necessidade de um controle prévio da Administração (...) pelo Judiciário (Op Cit, p. 321)

[11] Para maior aprofundamento sobre a metodologia de aplicação da regra da proporcionalidade Cf, por todos, DIMOULIS, Dimitri; MARTINS, Leonardo. “Teoria Geral dos Direitos Fundamentais”, 7ª ed, São Paulo: RT, 2020.

[12] O termo “acolher” contido no art. 93 do ECA deve ser compreendido como manifestação da segurança de acolhida própria da proteção social de grupos vulneráveis, portanto gênero do qual a medida de proteção de acolhimento institucional é espécie, não se podendo dizer efetivamente que as entidades aplicam a medida do art. 101, VII, do ECA, mas sim que exercem uma função de medida pré-cautelar (como é o caso da prisão em flagrante), a resguardar direitos imediatos de crianças e/ou adolescentes para que a autoridade judiciária, ouvido o Ministério Público, decida pela imediata reintegração da criança e/ou adolescente a sua família de origem ou, se por qualquer razão não for isso possível ou recomendável, por seu encaminhamento a programa de acolhimento familiar, institucional ou a família substituta (art. 93, parágrafo único, do ECA)

[13] MARTINS, Leonardo. Op Cit, p. 326

[14] O estudo diagnóstico tem como objetivo subsidiar a decisão acerca do afastamento da criança ou adolescente do convívio familiar. Salvo em situações de caráter emergencial e/ou de urgência, esta medida deve ser aplicada por autoridade competente, com base em uma recomendação técnica, a partir de um estudo diagnóstico, caso a caso, realizado por equipe interprofissional do órgão aplicador da medida ou por equipe formalmente designada para este fim. Em todos os casos, a realização deste estudo diagnóstico deve ser realizada sob supervisão e estreita articulação com Conselho Tutelar, Justiça da Infância e da Juventude e equipe de referência do órgão gestor da Assistência Social26. Sempre que necessário, o órgão aplicador da medida poderá requisitar, ainda, avaliação da situação por parte de outros serviços da rede como, por exemplo, da Delegacia de Proteção da Criança e do Adolescente e de serviços de saúde. Os fluxos e responsabilidades referentes à realização do estudo diagnóstico deverão ser definidos a partir de acordos formais firmados entre os órgãos envolvidos, considerando a realidade, os recursos existentes e o respeito às competências legais de cada órgão da rede de atendimento e do Sistema de Garantia de Direitos. O estudo diagnóstico deve incluir uma criteriosa avaliação dos riscos a que estão submetidos a criança ou o adolescente e as condições da família para superação das violações de direitos observadas e o provimento de proteção e cuidados. Com a devida fundamentação teórica, o estudo deve levar em conta a proteção e a segurança imediata da criança e do adolescente, bem como seu cuidado e desenvolvimento em longo prazo. O processo de avaliação diagnóstica deve incluir uma escuta qualificada de todos os envolvidos: integrantes da família, inclusive a criança e o adolescente27, pessoas da comunidade com vínculos significativos com a família e profissionais que estejam prestando-lhes atendimento, dentre outros. Além da avaliação dos riscos aos quais porventura a criança ou adolescente estejam expostos no ambiente familiar, antes de considerar o encaminhamento para serviço de acolhimento como uma alternativa para garantir sua proteção, é preciso observar se na família extensa ou comunidade há pessoas significativas que possam e aceitem se responsabilizar por seus cuidados. No estudo diagnóstico deve-se buscar identificar, ainda, se a situação de risco à qual está exposta a criança ou adolescente decorre exclusivamente do contexto social, histórico e econômico de vida da família e se a garantia de apoio, orientação e acesso às diversas políticas públicas seria suficiente para reduzir os riscos e possibilitar a manutenção do convívio familiar. Além de avaliar se há necessidade ou não de afastamento do convívio familiar, o estudo diagnóstico deve analisar o perfil e as demandas específicas da criança ou adolescente, de forma a subsidiar a decisão pelo encaminhamento para o serviço de acolhimento que melhor atenda às suas peculiaridades. Para a identificação do serviço mais adequado, deve-se considerar, ainda, sua estrutura física, recursos humanos e Projeto Político-Pedagógico, além da possibilidade de manutenção de vínculos comunitários da criança ou adolescente e a continuidade da freqüência à mesma escola e aos equipamentos comunitários aos quais estejam vinculados. Salvo nos casos em que o afastamento de sua comunidade de origem for essencial para garantir-lhes segurança, deve-se evitar que a inclusão em um serviço de acolhimento resulte no rompimento ou na fragilização dos vínculos comunitários e de pertencimento preexistentes. In: Orientações Técnicas: Serviços de Acolhimento para Crianças e Adolescentes (Resolução Conjunta CNAS/CONANDA nº 01/09), p. 29/31

[15] Resolução nº 113 do CONANDA

[16] O Disque Direitos Humanos - Disque 100 é um serviço disseminação de informações sobre direitos de grupos vulneráveis e de denúncias de violações de direitos humanos. Informações disponíveis em https://www.gov.br/mdh/pt-br/acesso-a-informacao/disque-100-1

[17] O art. 100, p. ún., IV, do ECA apresenta o princípio do interesse superior da criança e do adolescente informando que “a intervenção deve atender prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do adolescente, sem prejuízo da consideração que for devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses presentes no caso concreto”.

[18] Exemplificando, por todos: STJ, HC 341.047, com origem no AI 2191246-32.2015.8.26.0000.

 

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